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“O Poder Corrompe…” – Uma análise do Acordão do STF sobre Homeschooling

Reproduzo aqui para comentar o acórdão do iluministro Alexandre de Moraes, em acordão sobre o homeschooling em julgamento pelo STF. Verdades misturadas ao erro são as mais perigosas. O poder corrompe. O poder máximo corrompe maximamente. Por uma concessão da sociedade, o Estado torna-se solidário no dever de educar que cabe precipuamente à família. De solidário a substituto, de protetor a corruptor, de educador a juiz supremo, o Estado eleva a régua da qualidade do ensino, do conteúdo, da modalidade e da fiscalização para onde quer, entrando no seio das famílias, ameaçando-as com conselhos tutelares, ministérios públicos e perda da guarda dos filhos contra aqueles que querem justamente se defender do Estado corruptor.

O quão longe não vai de uma verdadeira definição de educação. Gosto de citar a do Abade René Berthléem, em seu Catecismo da Educação: “A educação é a arte de cultivar, exercitar, desenvolver, fortificar e polir todas as faculdades físicas, intelectuais, morais e religiosas , que constituem nas crianças a natureza e dignidade humanas; dar a estas faculdades uma perfeita integridade; elevá-las à plenitude de sua força e de sua ação. E, deste modo, formar o homem, prepará-lo a bem servir a pátria nos diversos cargos sociais, que um dia seja chamado a desempenhar através da jornada da vida; e assim, num alto pensamento, conquistar a vida eterna, enobrecendo a vida presente. Eis a obra e o fim da educação.” Na definição do Supremo, temos um vago “qualifica” tornando-a “esclarecida (sic!), politizada (sic!!) e desenvolvida (sic!!!). Segundo o mesmo, a educação também “dignifica”, segundo alguma não definida “dignidade da pessoa humana”. É justamente disso que estamos falando, o Estado, tornando-se tirânico, usa a educação para politizar segundo seus esquemas e interesses, principalmente afastando da educação aquele aspecto essencial que é o fim último do homem, a saber conquistar a vida eterna.

De um modo cada vez mais tecnocrático, o Estado moderno fixa o princípio de uma solidariedade entre ele e a família, que mais precisamente deveria se chamar subsidia­riedade se isso fosse bem entendido e aplicado, tal qual um a planta simbiótica que sufoca a árvore em que se apoia, suga sua seiva e a mata, enquanto faz de si mesmo a finalidade da sociedade. Inconstitucional não são as formas alternativas de educação paralelas à educação fiscalizada pelo Estado chamadas naquele Acórdão de unschooling, essa espécie de espantalho do homeschooling utilizado dialeticamente para manipular a opinião pública através dos meios de comunicação subservientes ao projeto de poder supremo do Estado. Inconstitucional é não reconhecer a primazia da família em educar seus filhos segundo as suas crenças e valores, que de modo algum podem ser impostos pelo Estado. A liberdade de educar os filhos segundo as próprias crenças é o valor supremo e o que mais dignifica tanto a pessoa titular do direito à educação, quanto à família, célula básica da sociedade. Anterior ao Estado, à família cabe julgar os conteúdos que podem ser nocivos à moral, à imaginação e até mesmo à verdade, seja filosófica seja dos fatos históricos, cuja manipulação ideológica é amplamente utilizada pelo Estado-Gigante em todas as épocas em que a sociedade nada fez para que assim não fosse. O homeschooling não é para educar menos, ou para fazer dos filhos energúmenos braçais no tecido social. Quem educa em casa quer assumir o protagonismo de educar mais e melhor, assumindo um verdadeiro ônus de tempo e de recursos para garantir que a base cultural da família tradicional seja mantida nos filhos, até que eles tenham a maturidade de se defenderem por si mesmos das ameaças ideológicas que o sistema de ensino superior vai continuar tentando impor.

  1. A educação é um direito fundamental relacionado à dignidade da pessoa humana e à própria cidadania, pois exerce dupla função: de um lado, qualifica a comunidade como um todo, tornando-a esclarecida, politizada, desenvolvida (CIDADANIA); de outro, dignifica o indivíduo, verdadeiro titular desse direito subjetivo fundamental (DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA). No caso da educação básica obrigatória (CF, art. 208, I), os titulares desse direito indisponível à educação são as crianças e adolescentes em idade escolar.
  2. É dever da família, sociedade e Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, a educação. A Constituição Federal consagrou o dever de solidariedade entre a família e o Estado como núcleo principal à formação educacional das crianças, jovens e adolescentes com a dupla finalidade de defesa integral dos direitos das crianças e dos adolescentes e sua formação em cidadania, para que o Brasil possa vencer o grande desafio de uma educação melhor para as novas gerações, imprescindível para os países que se querem ver desenvolvidos.
  3. A Constituição Federal não veda de forma absoluta o ensino domiciliar, mas proíbe qualquer de suas espécies que não respeite o dever de solidariedade entre a família e o Estado como núcleo principal à formação educacional das crianças, jovens e adolescentes. São inconstitucionais, portanto, as espécies de unschooling radical (desescolarização radical), unschooling moderado (desescolarização moderada) e homeschooling puro, em qualquer de suas variações.
  4. O ensino domiciliar não é um direito público subjetivo do aluno ou de sua família, porém não é vedada constitucionalmente sua criação por meio de lei federal, editada pelo Congresso Nacional, na modalidade “utilitarista” ou “por conveniência circunstancial”, desde que se cumpra a obrigatoriedade, de 4 a 17 anos, e se respeite o dever solidário Família/Estado, o núcleo básico de matérias acadêmicas, a supervisão, avaliação e fiscalização pelo Poder Público; bem como as demais previsões impostas diretamente pelo texto constitucional, inclusive no tocante às finalidades e objetivos do ensino; em especial, evitar a evasão escolar e garantir a socialização do indivíduo, por meio de ampla convivência familiar e comunitária (CF, art. 227).
  5. Recurso extraordinário desprovido, com a fixação da seguinte tese (TEMA 822): “Não existe direito público subjetivo do aluno ou de sua família ao ensino domiciliar, inexistente na legislação brasileira”.

A C Ó R D Ã O

Vistos, relatados e discutidos estes autos, os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Plenário, sob a Presidência da Senhora Ministra CÁRMEN LÚCIA, em conformidade com a ata de julgamento e as notas taquigráficas, por maioria, apreciando o tema 822 da repercussão geral, acordam em negar provimento ao recurso extraordinário, vencido o Ministro Roberto Barroso (Relator) e, em parte, o Ministro Edson Fachin. Redator para o acórdão o Ministro Alexandre de Moraes. Ausente, justificadamente, o Ministro Celso de Mello.

Brasília, 12 de setembro de 2018.

Ministro ALEXANDRE DE MORAES

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